Em seu livro sobre a Santa Sé, o sociólogo italiano Claudio Rendina revela fatos inéditos e mostra que a avareza, os conchavos e os interesses políticos - mesmo em apoio a regimes totalitários - ainda regem a sede do catolicismo
Laura Daudén
Ele é católico, mas, nos corredores do Vaticano, é o próprio demônio. Claudio Rendina, escritor, sociólogo e colaborador do tradicional jornal italiano “La Reppublica”, acaba de lançar “Os Pecados do Vaticano – Soberba, Avareza, Luxúria, Pedofilia” (Ed. Gryphus).
COOPERAÇÃO :
Nele, o especialista em assuntos da Santa Sé julga os escândalos da Igreja Católica a partir dos paradigmas morais por ela pregados. “Recebi cartas anônimas me acusando de comunista e fascista, e isso não faz nenhum sentido”, disse ele à ISTOÉ sobre a intimidação que sofre por conta de seu livro.
Baseada em pesquisa que abrange do ano 30 d.C. até os dias de hoje, a obra escancara as portas que, por muito tempo, tentaram blindar as autoridades eclesiásticas do Vaticano.
O que mais o chocou nessa longa investigação foram os casos de avareza, uma “indicação da riqueza desmedida da primitiva Igreja de Roma, renovada pelo nepotismo medieval e renascentista”, segundo ele.
Outros pontos absurdos são os que demonstram a estreita ligação entre a Santa Sé e o regime fascista de Benito Mussolini.
O livro descreve, por exemplo, como se deu a fundação da empresa de seguros Praevidentia, criada pelo engenheiro financeiro Bernardino Nogara para ajudar a sanar as contas da Santa Sé e da qual participaram diversos senadores claramente adeptos do fascismo.
Também expõe a cumplicidade do papa na guerra de ocupação da Etiópia pela Itália em 1935 ao fornecer armas ao Exército italiano por meio da Officine Meccaniche Reggiane, outra empresa criada com o fim de levantar capitais – um movimento de apoio mútuo oficializado em 1929 pelos Pactos de Latrão (foto), em que Mussolini reconhece o Estado do Vaticano e regulamenta seu sistema financeiro.
O ditador Benito Mussolini (ao centro) e autoridades eclesiais: autonomia financeira ao Vaticano
Também há uma infinidade de histórias de luxúria e extravagância. Uma das mais curiosas é a da paixão do papa Gregório XVI (1831-1846) pela esposa de Gaetano Moroni, barbeiro pessoal do cardeal Cappellari.
Ao longo de sua pesquisa, Rendina deparou-se com os seguintes versos que tratam do romance do papa com a mulher do barbeiro: “Gaetanino é casado: a sua esposa / É uma mulher garbosa, bastante devota / Do vigário de Deus que prende e solta.”
O livro chega às livrarias de diversos países em um momento especialmente delicado para o papa Bento XVI. Os últimos escândalos, desencadeados pelo vazamento de documentos secretos por seu mordomo pessoal, comprovam que pouco separa o Vaticano atual daquele que serve de palco para as histórias de Rendina.
Como a Santa Sé será julgada por essa incapacidade de se renovar e de operar sobre as bases morais que ela mesma instituiu?
Para o autor, no contexto do Estado laico, a opinião pública não pode punir a Igreja por seus pecados, mas sim estimulá-la para que “abandone a sua materialidade e se mostre verdadeiramente divina”.
COMENTÁRIO
Nenhum comentário:
Postar um comentário